Menos de 30 segundos depois de receber o microfone pela primeira vez como técnico da seleção masculina de basquete, Gustavo de Conti precisou pausar a fala para respirar e se recuperar emocionalmente. A honra de ser apresentado como comandante do Brasil na sede do Comitê Olímpico do Brasil (COB), na terça-feira (28), possivelmente se assemelha ao que ele espera dos atletas que passará a treinar a partir de novembro. Por repetidas vezes, Gustavinho destacou que deseja que a experiência de defender o país não seja vivida como uma simples tarefa, igual a qualquer outra.
"Eu não quero que pareça que eu estou apenas sendo contratado para ser o técnico da seleção brasileira. Algo formal. Quero que seja algo mais leve, com mais sentimento envolvido por todas as partes. Queremos ver todos engajados e unidos", afirmou.
O técnico voltou a citar a necessidade do tal "sentimento envolvido" ao tocar em um tema delicado desde que a ida de jogadores brasileiros para a NBA se tornou mais frequente. Com isso, ter todos os supostos melhores atletas do país reunidos ficou cada vez mais difícil, já que o calendário da liga norte-americana e o interesse das equipes em preservar os jogadores para os quais pagam salários milionários são obstáculos constantes. O último técnico da seleção, o croata Aleksandar Petrovic, inclusive, deixou uma polêmica impressão quando lamentou, por meio de mensaem no Twitter, a perda da vaga olímpica em Tóquio depois dos pedidos de dispensa de alguns atletas. Ele citou nominalmente Didi e Raulzinho.
"Dentro de uma equipe cada jogador tem seus objetivos individuais, que não podem nunca ser maiores do que os objetivos do time. A seleção é para quem quer estar na seleção. Nenhum jogador no basquete mundial é insubstituível. Nem LeBron James. Se um determinado atleta tem uma meta que naquele momento confronta com a seleção, é melhor que ele não vá então. Outro vai fazer parecido", opinou.
Como suporte para suas visões, Gustavinho tem um currículo invejável dentro do basquete brasileiro. São dois títulos do NBB e um da Champions League Américas pelo Flamengo, além de mais uma conquista nacional pelo Paulistano. Ele é o peculiar caso de um técnico já veterano mesmo com apenas 41 anos, já que começou aos 17. A primeira oportunidade, na escolinha do Clube Atlético Ypiranga, em São Paulo, foi enaltecida por De Conti durante a coletiva.
"Eu respeito a história do grande jogador que vira treinador, assim como a do campeão olímpico que se torna treinador também. Respeito todas essas histórias mas me orgulho muito da minha também. De ter começado com meninos de seis, sete anos de idade, em 1997. Passei por todas as categorias de base, nos clubes e na seleção. São quase 1300 jogos oficiais como treinador desde que eu comecei. Talvez essa tenha sido a maior capacitação que eu tive para chegar até aqui", disse.
O técnico, aliás, chegou a um lugar que nenhum brasileiro alcançava desde 2008. O espanhol Moncho Monsalve e o argentino Ruben Magnano precederam Petrovic em um período em que os treinadores brasileiros até ocupavam posições nas comissões técnicas, mas nunca no espaço principal do banco de reservas.
"Não vou dizer que era unanimidade mas muita gente concordava com isso. Mas, olhando pelo lado bom, hoje a pesquisa, a preparação, a qualidade em geral dos técnicos brasileiros melhorou muito. Serviu como um 'cutucãozinho', um estímulo como se dissessem: 'Vai lá, vamos estudar mais, nos preparar mais, ver o que está acontecendo no mundo'", expôs Gustavinho.
Em termos de metas, o treinador - que permanecerá no comando do Flamengo -, pouco falou sobre a disputa pela vaga nos Jogos de Paris, em 2024. Ele se manteve concentrado no próximo objetivo, que é estrear bem nas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2023, que começam com os compromissos diante do Chile, em 26 e 27 de novembro. Gustavinho revelou não ter preferência entre atletas jovens ou veteranos e que pretende imprimir um estilo mesclado entre o pausado basquete europeu e o veloz e físico basquete norte-americano. Quando falou em futuro distante, foi mais para oferecer uma perspectiva de processo, não de resultados.
"Talvez eu não esteja mais aqui quando a seleção brasileira começar a ter resultados importantes, como disputar uma final mundial ou olímpica. Mas precisamos plantar alguma coisa aqui".
(Texto: Igor Santos/Agência Brasil. Foto: Diego Maranhão/Divulgação)
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